O que o autista sente na hora de uma crise?

 

Olá, seja muito bem-vindo ao conteúdo de hoje! Meu nome é Luciana, tenho 23 anos, sou autista, e vocês estão no “Vivendo no Espectro”.

Nesta semana, muitos acontecimentos marcaram meus dias. Tive várias crises, o que chamou a atenção de quem me acompanha no Instagram, onde compartilho meu dia a dia. Por sinal, se ainda não me segue por lá, recomendo que o faça. Muitos têm me questionado sobre como é uma crise autista, o que uma pessoa sente durante uma e deseja compreender mais sobre o autismo. Alguns no processo de diagnóstico, outros têm um filho autista e desejam entender melhor seus sentimentos. Dado o número de episódios que vivi recentemente, decido conversar com vocês sobre isso.

Para contextualizar, encontre-me aqui sem maquiagem, após tomar banho. São 9 horas da noite, um momento mais tranquilo. Eu realmente adoro maquiagem, mas ultimamente tive bastante sensibilidade na pele, o que me deixou um pouco desconfortável.

Detalharei o que aconteceu esta semana e abordarei as crises que experimentei

Na sexta-feira, minha rotina foi moderadamente alterada. Havia planejado postar algumas encomendas, participar de uma reunião da faculdade, dar aulas de música e cozinhar. No entanto, de manhã, os planos já começaram a dar errado. Os correios não aceitaram minhas encomendas, o que me levou a procurar uma transportadora alternativa. Isso me desestabilizou. No caminho da transportadora, sofri uma série de contratempos que me sobrecarregaram sensorialmente, incluindo o calor intenso, problemas com aplicativos de transporte, entre outros.

A sobrecarga sensorial é intensa para uma pessoa autista. Barulhos se intensifica, as sensações na pele se tornam quase insuportáveis. Naquele dia, após tantos estímulos, desabei e comecei a chorar em público. Para muitos, pode parecer um comportamento infantil ou mimado, mas não é. Era a forma do meu corpo reagir à sobrecarga. Depois de algum tempo, consegui me recompor e voltar para casa.

No meio desse caos, sinto dores no corpo, estresse, e ainda tenho que preparar o almoço para levar marmita para meu marido. Nesse dia, tudo estava tumultuado. Mesmo tudo planejado com antecedência e gostando de preparar comida, as circunstâncias me levaram ao limite.

autista

No caminho para o transportador, o GPS falhou e me guiou para o lugar errado, tornando a viagem ainda mais longa e desafiadora. Em meio ao sol escaldante, quando finalmente consegui o local e entreguei a encomenda, pensei em aproveitar e comprar algumas coisas no mercado.

Mas, já exausta e sobrecarregada com o calor e suor, as sensações na minha pele ficaram insuportáveis. O peso das sacolas e a demora para conseguir um Uber, somados ao barulho intenso do trânsito e das pessoas, elevaram minha sobrecarga sensorial ao máximo.

Essa combinação de estímulos foi demais para mim. Os filhos passaram três vezes mais altos, os ônibus, os carros, as buzinas, as pessoas falando, tudo se misturou em um turbilhão de sensações. Foi quando o pico de estímulo atingiu e eu simplesmente desabei, chorando em público.

Pode parecer algo simples para muitos, mas no meu caso, como pessoa autista, o excesso de estímulos é avassalador. A sobrecarga sensorial é real e poderosa. Não é mimada ou infantil; é uma verdade genuína e, muitas vezes, incontrolável.

Depois de chorar por um tempo, consegui levantar e caminhar lentamente, mesmo ainda emocionado. Algumas das compras que fiz, infelizmente, estragaram devido ao tempo que passei sentado, mas eventualmente cheguei em casa e consegui comer.

Experiência de Crise em Autistas

Tinha uma aula marcada para as 2 horas. No entanto, minha aluna, que também é autista, estava passando por um dia particularmente difícil. De forma compreensiva, ela concordou em adiar a aula, o que aliviou a pressão de ambos os lados.

Depois disso, enfrentei um desafio ao visitar meu neurologista. Mesmo com todos os documentos e indicações em mãos, o profissional agiu de forma insensível e abrupta. Ele se recusou a me atender simplesmente por eu ser autista, direcionando-me de forma rígida a buscar um psiquiatra. Faltou empatia e interesse genuíno em entender ou ajudar no meu caso.

Porém, os desafios do dia não pararam por aí. Minas Gerais estava enfrentando uma greve de ônibus, o que complicou minha volta para casa. Acidentalmente, peguei o ônibus errado e acabei me perdendo. Tive que caminhar por um longo trecho sob o sol, o que me levou a ter uma crise intensa no meio da rua, agravada pelos estímulos externos como o barulho dos carros e buzinas.

Neste contexto, acho importante esclarecer os diferentes tipos de crises que pessoas autistas, como eu, podem enfrentar. Há a crise que se assemelha a um forte ataque de ansiedade, onde há uma sensação avassaladora, o coração acelera e os estímulos externos parecem intensificados. Há também o que chamamos de “Meltdown”, um colapso do sistema emocional, que pode envolver desde agressões até autoagressões e outros comportamentos explosivos. Este tipo de crise é intenso, mas tende a ser de curta duração. Por último, há o “Shutdown”, um estado em que nos “desligamos”. Nesse estado, a pessoa se isola e parece não responder ou se comunicar, podendo durar de horas a dias.

Após a crise, enfrento diversas sensações físicas, como dores de cabeça persistentes, rigidez no corpo e um cansaço quase debilitante. É importante diferenciar a sobrecarga causada por estímulos diários da sobrecarga resultante de uma crise. A primeira é uma exaustão do cotidiano, enquanto a segunda é mais profunda e avassaladora.

Compartilho essas experiências e sentimentos, não apenas para desabafar, mas também para agradecer o apoio e interação que tenho recebido nas redes sociais. Por vezes, sinto dificuldade em me fazer entender, mas estou sempre tentando. Em breve, pretendo compartilhar em vídeo algumas dicas de como lido com essas situações e como consegui me reerguer após episódios tão desafiadores.